Canela Preta (Pé Negro, pt)
Erwinia carotovora subsp. atroseptica (Sinônimo: Pectobacterium atrosepticum )
Batata (Solanum tuberosum)
Escurecimento de hastes e murcha de folhas são típicos da Canela Preta
da cultura da batata (Pé Negro da Bateira, pt)(Cortesia de S.H. De Bôer)
Sintomas e sinais
Na parte aérea (folhagem)
A Canela Preta (Pé Negro, pt) algumas vezes se desenvolve prematuramente na cultura, tão logo as plantas emergem. Isso se refere à Canela Preta (Pé Negro, pt) precoce e é caracterizada por uma redução de porte, amarelecimento das folhas, que se aparentam duras (coriáceas), voltadas para cima t (Figura 1). A parte inferior da haste subterrânea de tais plantas se apresenta de coloração marrom (castanha, pt) escura a negra e extensamente apodrecida (Figura 2). A medula da haste é particularmente suscetível ao apodrecimento e, em plantas com Canela Preta (Pé Negro, pt), essa podridão interna pode se estender muito além do tecido com sintoma externo visível da podridão. Essa coloração negra e podridão mole da parte basal das hastes é que dá a designação de "canela preta" (Pé Negro, pt) à doença. Plantas jovens atacadas pela Canela Preta (Pé Negro, pt) não conseguem se desenvolver e tipicamente morrem
Figura 1 |
Figura 2 |
Além da Canela Preta (Pé Negro, pt) precoce, a doença também pode se desenvolver mais tarde durante o crescimento. Nas plantas mais velhas, a Canela Preta (Pé Negro, pt) aparece como um enegrecimento de tecidos anteriormente sadios, acompanhada de uma rápida murcha das folhas com eventual amarelecimento (Figura 3). O enegrecimento das hastes sempre se inicia abaixo do nível do solo e sobe para a parte aérea, frequentemente até que a haste toda esteja preta e murcha. Nos estágios iniciais do desenvolvimento da doença em hastes adultas, as folhas podem amarelecer e murchar, mesmo antes que a podridão negra esteja evidente. Contudo, depois que toda a haste foi tomada, ela apodrece, se torna seca e, com frequência desaparece do dossel da cultura.
Figura 3 |
Inevitavelmente, a Canela Preta (Pé Negro, pt) se origina no tubérculo mãe de onde a planta está se desenvolvendo. Uma podridão bacteriana que se desenvolve em hastes quebradas ou danificadas não deve ser confundida com a Canela Preta (Pé Negro, pt), embora os sintomas sejam semelhantes. Este sintoma na parte aérea é normalmente causado por Erwinia carotovora subsp. carotovora, um patógeno aparentado com a bactéria da Canela Preta (Pé Negro, pt). A podridão aérea é normalmente de coloração marrom (castanha, pt) mais clara do que a da Canela Preta (Pé Negro, pt) e, embora esta prossiga para cima na planta, ela não se inicia na parte subterrânea da haste (Figura 4). Outra podridão mole e úmida, muito semelhante à Canela Preta (Pé Negro, pt) em vários aspectos, é causada por outra bactéria, Erwinia chrysanthemi. Embora essa podridão mole da haste seja uma doença significativa na Europa, principalmente na Holanda onde não se distingue da Canela Preta (Pé Negro, pt), não se sabe de sua ocorrência na América do Norte.
Figura 4 |
Em tubérculos
Há duas maneiras pelas quais a bactéria da Canela Preta (Pé Negro, pt) pode chegar nos novos tubérculos produzidos na planta de batata. Uma importante rota da infecção do tubérculo é via estolão ao qual liga à planta mãe. Tubérculos com Canela Preta (Pé Negro, pt) em geral, primeiramente apodrecem no ponto de ligação do estolão, quando os tecidos se tornam negros e amolecidos (Figura 5). Na progressão da doença, todo o tubérculo pode apodrecer, ou a podridão pode ser parcialmente restrita ao tecido interno perimedular (ou parenquimático), ou seja, nos tecidos internos ao anel vascular (Figura 6).
Figura 5 |
Figura 6 |
Uma rota alternativa para o ataque dos tubérculos novos é através do solo. À medida que a Canela Preta (Pé Negro, pt) causa o apodrecimento das hastes subterrâneas e tubérculo mãe, a bactéria se espalha do tecido infectado para a solução do solo e se distribui por todo o ambiente radicular onde os novos tubérculos estão se desenvolvendo. As células bacterianas penetram nas lenticelas desses tubérculos e se tornam inativas ou, sob condições favoráveis, iniciam a podridão.
No ambiente de armazenamento mal manejado, a bactéria da Canela Preta (Pé Negro, pt) presente na superfície dos tubérculos pode causar extensas podridões Figura 7). Algumas vezes, com a melhoria nas condições do armazém, as lesões ao redor de lenticelas ou de danos mecânicos são suprimidas, resultando no que se chama de "podridão seca". A "podridão seca" é tipificada por leves depressões, marrom (castanhas, pt) enegrecidas, secas e necróticas ao redor de lenticelas ou machucaduras.
Figura 7 |
Uma vez que a podridão mole do tubérculo começa pela bactéria da Canela Preta (Pé Negro, pt), o crescimento de bactérias secundárias frequentemente contribui nesse processo e certamente modifica a sintomatologia da doença. Então, uma podridão mole generalizada se desenvolve a partir da infecção inicial da Canela Preta (Pé Negro, pt) no tubérculo. A podridão mole bacteriana é caracterizada pela maceração total do tecido do tubérculo e do corrimento de um líquido pútrido escuro.
Biologia do Patógeno
O agente causal da Canela Preta (Pé Negro, pt) é Erwinia carotovora subsp. atroseptica, uma bactéria Gram negativa, tipo bastonete, proximamente relacionada com bactérias entéricas de importância como patógenos de humanos e animais. As bactérias do gênero Erwinia, contudo, não são tidas como perigosas a humanos ou animais. Seu crescimento em meio de polipectato de sódio induz a formação de buracos ou crateras no meio devido à excreção de enzimas pectolíticas que dissolvem o pectato (Figura 8). As enzimas pectolíticas são, de fato, um componente importante dos fatores de patogenicidade desta e outras bactérias relacionadas. Em reconhecimento a atividade pectolítica especial dessas bactérias, propôs-se sua alocação em um gênero separado, Pectobacterium. Além disso, recentemente se sugeriu, com base em sua composição genética, que ela seja considerada uma espécie distinta, Pectobacterium atrosepticum.
Figura 8 |
Várias subespécies de E. carotovora causadoras de doenças em outras culturas já foram descritas. Essas subespécies podem causar podridão em fatias de batata, mas não induzir a Canela Preta (Pé Negro, pt). Uma nova estirpe de E. carotovora foi descrita e que causa um tipo de Canela Preta (Pé Negro, pt) em batata no Brasil. Resultados preliminares sugerem que a subespécie atroseptica não ocorre em batata onde essa nova subespécie, tentativamente denominada de brasiliensis, é encontrada.
A característica mais importante da bactéria da Canela Preta (Pé Negro, pt) é sua atividade enzimática pectolítica, mas em contraste a várias outras bactérias pectolíticas, ela não cresce acima de 36°C. É anaeróbica facultativa, significando que pode se desenvolver tanto na presença ou não de oxigênio. É móvel com flagelos peritriquios. A maioria das estirpes de E. carotovora subsp. atroseptica pertence ao sorogrupo I, muito embora vários sorogrupos ocorram. Em função da relativa uniformidade do tipo sorológico, métodos sorológicos como o ELISA e o de imunofluorescência podem ser usados para sua detecção. Métodos moleculares incluindo o PCR (reação da polimerase em cadeia) estão também disponíveis para a detecção desta bactéria.
A bactéria da Canela Preta (Pé Negro, pt) pode ser isolada em meio seletivo como o pectato violeta cristal (CVP, Figura 9) com mais eficiência a aproximadamente 22°C. As colônias dessa Erwinia pectolítica podem ser facilmente identificadas no meio com um microscópio estereoscópico usando iluminação oblíqua, ou seja, iluminando o fundo da placa de Petri em ângulo. As colônias repicadas do meio CVP crescem bem em qualquer meio bacteriológico como o agar-nutriente. A patogenicidade de isolados pode ser facilmente determinada em plântulas (10-15 cm/4-6" de altura) de batata enfiando-se um palito de dente infestado com células bacterianas. Os sintomas de Canela Preta (Pé Negro, pt) aparecem dentro de duas semanas (Figura 9).
Figura 9 |
Ciclo da doença e Epidemiologia
Ciclo da doença
A bactéria da Canela Preta (Pé Negro, pt) sobrevive muito pouco no solo. Muito embora membros das erwinias pectolíticas sobrevivam na superfície da água e no solo, todas as evidências sugerem que esta bactéria não sobrevive bem a não ser associada com tecidos do hospedeiro. Por isso, o tubérculo semente é a mais importante fonte de inóculo no ciclo da Canela Preta (Pé Negro, pt). Quando tubérculos infectados são plantados, uma de três situações pode ocorrer. (1) Células bacterianas podem se mover através do sistema vascular até a planta em desenvolvimento e a doença se instala. Se a contaminação está confinada a lenticelas, a podridão do tubérculo semente vem primeiro e quando a população bacteriana cresce o suficiente, a invasão das hastes em crescimento ocorre. Tanto o processo da podridão do tubérculo semente quanto a disseminação e invasão das hastes são altamente dependentes de condições ambientais. Umidade e frio favorecem a doença. (2) Quando as condições ambientais são favoráveis para o desenvolvimento da planta, a Canela Preta (Pé Negro, pt) pode não ocorrer mesmo com a presença da bactéria. (3) A podridão do tubérculo semente pode ocorrer antes do desenvolvimento da planta, e isto, também, é uma forma de manifestação da Canela Preta (Pé Negro, pt), embora outros membros das bactérias pectolíticas possam causar essa podridão.
A situação mais frequente que ocorre quando se planta muda contaminada é que o tubérculo semente apodrece após o estabelecimento da planta e nenhum sintoma de Canela Preta (Pé Negro, pt) aparece. Neste caso, o exsudato bacteriano se espalha contaminando todo o sistema radicular incluindo os tubérculos em formação. A superfície desses tubérculos se torna contaminada pelas bactérias sobreviventes, particularmente nas lenticelas. No armazenamento, os tubérculos contaminados podem apodrecer, desenvolver podridão seca ou permanecer sem sintomas. Quando esses tubérculos contaminados e sem sintomas são usados para o plantio, e normalmente o são, o ciclo da doença se repete.
A contaminação de tubérculos é aumentada com as operações de colheita e armazenamento. Um único tubérculo com podridão de Canela Preta (Pé Negro, pt) pode contaminar muitos outros na passagem pelas correias da arrancadeira e caixarias e sacos de transporte a granel. No armazenamento as podridões de tubérculos contaminados é um problema corriqueiro. Tubérculos com machucaduras são mais vulneráveis ao apodrecimento pelas erwinias pectolíticas. A presença de umidade em tubérculos armazenados favorece o desenvolvimento da podridão, pois a película de água rodeando o tubérculo torna o microambiente anaeróbico. A falta de oxigênio inibe as atividades metabólicas do tubérculo e previne as reações normais de resistência.
O Manejo da Doença
Pré-plantio
Houve tempos em que quase todos os tubérculos de batata vinham contaminados com a bactéria da Canela Preta (Pé Negro, pt). Isso não é mais verdade hoje em dia. A utilização de plântulas sadias oriundas de cultura de tecido para iniciar lotes de tubérculo semente quebrou o ciclo de ter-se tubérculos contaminados ano após ano. Também, com a limitação do número de gerações de campo de 5 a 7 anos na produção de lotes individuais de semente a partir de plântulas de cultura de tecido, o aumento na ocorrência de tubérculos contaminados é reduzido. Por isso, a incidência de Canela Preta (Pé Negro, pt) é significativamente mais baixa do que era antes da incorporação da cultura de tecidos nos programas de produção de batata semente. Embora a redução da doença seja significativa em algumas regiões geográficas, ela permanece importante em outras regiões onde práticas similares são adotadas. As razões para essas diferenças na incidência da doença não está esclarecida, mas provavelmente está relacionada com a velocidade com que os lotes de sementes são expostos ao inóculo.
No plantio
O plantio de tubérculo semente de poucas gerações, em áreas bem drenadas e com temperaturas do solo acima de 10°C, é recomendado para evitar o desenvolvimento da Canela Preta (Pé Negro, pt)..
Durante o desenvolvimento da cultura
A eliminação de plantas atacadas com Canela Preta (Pé Negro, pt), incluindo o que está abaixo do solo, reduz o inóculo do solo, mas somente será uma prática útil se medidas preventivas forem tomadas para prevenir o contato de tecidos doentes com outras plantas no campo.
Na colheita e durante o armazenamento
Evitar injúrias nos tubérculos durante a colheita é importante para diminuir o apodrecimento no armazém. A remoção de tubérculos podres antes que eles espalhem seus conteúdos sobre esteiras de classificação e caixas e sacarias evita a disseminação da bactéria sobre outros tubérculos. A cicatrização de danos mecânicos é importante na fase inicial do armazenamento para prevenir o desenvolvimento de podridões. Durante o armazenamento, portanto, a batata deve ser conservada em baixas temperaturas com aeração adequada para promover ambiente seco e prevenir a condensação de umidade na superfície dos tubérculos.
Significância
As diferentes manifestações da Canela Preta (Pé Negro, pt) da batata como doença das plantas, podridão de tubérculo semente e podridões durante a armazenagem, contribuem para as perdas econômicas. Embora a doença seja considerada de menor importância em algumas regiões, ela continua sendo grande problema para a produção em outras. O controle da doença depende totalmente nas práticas de manejo da cultura, já que não existe controle químico. Mesmo havendo diferenças de suscetibilidade entre cultivares, não existe imunidade entre elas. O uso contínuo de plântulas derivadas de cultura de tecidos e minitubérculos (produzidos das plântulas em ambiente protegido) para iniciar novos lotes de sementes acoplados com o número reduzido de gerações de campo, são práticas essenciais para minimizar a contaminação de lotes de tubérculo semente e manter o nível de controle obtido até agora. Naquelas áreas onde a doença não é controlada adequadamente, mais investigação deve ser feita para determinar-se a fonte de inóculo na qual as plantas livres da bactéria da Canela Preta (Pé Negro, pt) se tornam contaminadas. Se a bactéria sobrevive no solo ou na água de irrigação em níveis abaixo do detectável deve ser investigado. A disseminação da bactéria no meio ambiente de lavouras de gerações avançadas para novos lotes de sementes via água, derivas de chuva ou insetos também precisa ser estudada.
A pesquisa molecular em erwinias pectolíticas, incluindo a bactéria da Canela Preta (Pé Negro, pt), tem mostrado muitos aspectos fascinantes sobre a genética da patogenicidade em fitobactérias. Os mecanismos genéticos complexos que modulam a expressão e excreção de enzimas pectolíticas agora que estão sendo entendidos. A importância da formação do biofilme e mecanismos associados de sinalização entre células bacterianas e hospedeiro estão recentemente sendo investigados. O sequenciamento do genoma da bactéria da Canela Preta (Pé Negro, pt) está em andamento e se espera revelação ainda maior sobre a habilidade dela em causar a doença na cultura da batata e os mecanismos com que ela o faz.
Referências Selecionadas
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